domingo, 31 de janeiro de 2016

O fim da relação senhor-escravo



Vou assustar, de início.

O problema principal  da humanidade é a gigantesca memória afetiva dos benefícios produzidos pela relação senhor-escravo.  Isso mesmo, a civilização que conhecemos precisou desse esquema para chegar até aqui.  Muitas pessoas trabalharam muito e desumanamente para que outros poucos pudessem desenvolver o pensamento e a tecnologia.

Se Aristóteles tivesse que capinar e caçar todos os dias para sobreviver, não teria feito a obra que fez. 

Claro que essa civilização precisa ser criticada e transformada, e que há outros formatos de civilização, por exemplo, dos silvícolas brasileiros, que embora não tenham prevalecido, não foram, felizmente, totalmente extintos, pois serão imprescindíveis para a mudança que virá.

Porém, hoje, mesmo já havendo, por força do desenvolvimento alcançado, a possibilidade de superar a polarização senhor-escravo (escravo, servo, operário – na sequência histórica), não conseguimos ultrapassá-la.  Porque a memória afetiva é mesmo muito presente.  Quando vamos a um restaurante, vamos apenas em busca de comida? Não, vamos em busca também da representação da relação senhor-escravo.  Há escravos para servir, para cozinhar, e nós ficamos ali como senhores (senhores, nobres, patrões – na sequência histórica).  Exigimos qualidade, presteza, cortesia e quase sempre sentimos ali uma surpreendente harmonia.

Por isso, para superar esse dualismo, precisaremos de uma nova política baseada na psicologia, na psicoterapia - que provisoriamente eu chamo de “psicoterapia do lado público do homem” -, capaz de desarmar essa memória afetiva e abrir caminho para uma nova sociedade mais igualitária. Mas essa técnica ainda não existe, precisa ser criada.

É isso. Espero que minha interpretação possa ter transformado o susto inicial em complexa esperança.