Existe
cultura sem escola, mas existe escola sem cultura?
Muitas vezes
é essa a impressão que a escola passa.
Parece querer se independer da cultura.
Conhecimentos escolares/acadêmicos seriam uma categoria estanque
separada do saber cotidiano, dos valores, das regionalidades, da arte em geral,
do bom senso, do “jeito” de viver, da maneira de lidar com as tecnologias ,
enfim, de tudo que reconhecemos como sendo a cultura humana de uma dada
comunidade.
Eu diria que
quanto mais a escola tenta essa aventura vazia, a de se independer da cultura,
mais se mostra insuficiente, alienante e improdutiva.
1. Pesquisar/estudar
a bibliografia a respeito dessa interação e da resistência a essa interação,
conhecer o pensamento sobre isso dos atores envolvidos diretamente com a escola
é um caminho que gostaria de trilhar.
2. Em seguida,
haveria que se verificar a validade da inclusão na escola de atividades
culturais que não fossem “reféns” das atividades escolares, ou seja, que não
fossem meras matérias-primas para as atividades escolares típicas, e sim que
tivessem seu valor em si reconhecidas dentro da escola, como parte fundamental
da formação do educando.
3. Outras
linhas que se seguiriam a essas: conhecer profundamente um sistema educacional que
valorize a vivência cultural dentro do processo escolar (parece que é o caso da
Finlândia), e conhecer outro que não o faz (parece que é o caso do Brasil – nossas escolas podem ter fanfarras, mas
não podem ter escolas de samba), pois assim teríamos dados da realidade e
elementos concernentes da literatura científica que poderiam ser
inter-relacionados para um resultado final consistente e, possivelmente,
revelador de um vetor para a criação de uma escola integrada culturalmente e
compatível com os novos tempos, os quais surgem e urgem.
4. Pesquisar
a implicação da descoberta das várias inteligências humanas no desmonte da
escola que conhecemos, isolada da cultura – causa possível: consideração quase
exclusiva das inteligências lógico-linguística e lógico-matemática – e, por
conseguinte, implicação dessa descoberta na criação da nova escola, que, ao
reconhecer a diversidade intelectual e emocional humanas, aceitará sua plena
imersão na cultura – produto óbvio de todos, vale dizer, de todas as
inteligências humanas.
5. A respeito
da literatura sobre cultura, talvez seja um bom ponto de partida as elaborações
teóricas propositoras de que a cultura faz-se muito mais na recepção do que na
emissão. Pois que os conhecimentos
típicos produzidos na escola têm características universais (equação de 3º grau
é equação de 3º grau no mundo inteiro), mas a forma como esses conhecimentos
são percebidos, ou trabalhados, ou aprendidos, sofrem uma influência da cultura
presente em cada ser humano envolvido no processo. Daí a importância de se pesquisar a relação
recepção-cultura. Talvez por isso, os grandes centros de pesquisa do mundo
inteiro valorizam a multietnia na formação das equipes de pesquisadores. Múltiplas e sutis diferenças produzindo
enriquecimento do processo.
6. No que tange
à abordagem da arte no contato proposto escola-cultura, talvez fosse
interessante estudar os teóricos que afirmam a capacidade da arte de ser
produtora e expressão de conhecimentos, pensando-se aqui no conhecimento mais
facilmente reconhecido como conhecimento escolar/acadêmico.
7. Quanto à
escola, talvez caiba detectar a presença da cultura ou a falta dela em todas as
propostas para o trabalho com projetos de interdisciplinaridade e
transdisciplinaridade, mas também pesquisar os autores que consideram os
conhecimentos tipicamente escolares como produtos culturais.
8. Uma outra
possibilidade talvez bastante original para essa pesquisa seria o levantamento
de, p. ex., como os Prêmios Nobel de um país, ou pesquisas marcantes feitas por
seus pesquisadores têm elos de identificação com traços de sua cultura. Apenas a título de tentativa de encontrar
evidências, poder-se-ia citar a “improvisação” de Cesar Lattes nas emulsões das
chapas fotográficas que detectaram a sub-partícula méson-pi (o Nobel foi para o
chefe de sua equipe, mas foi ele, Lattes, o responsável pela descoberta). O que teria de brasileiro nisso? Ora, o nosso desprendimento em relação aos
trâmites mais tradicionais, nossa habilidade (para o bem e para o mal) para a
improvisação, o “jeitinho brasileiro”, enfim, essa coisa meio iconoclasta. Quanto
às teorias que relativizam o tempo e o espaço, qual país, visto pelos seus
traços culturais mais característicos, melhor do que a Alemanha – geralmente associada
a aprofundamento filosófico - para fazer essas descobertas.
Vale explicar que estou citando esse prêmio
por ser muito conhecido e fácil de ser pesquisado, mas há outros indicadores, claro.
E que estou trabalhando com ele por representar bem o conhecimento escolar ou
acadêmico.
Provavelmente,
Prêmios Nobel ganhos por um mesmo país estejam relacionados com um traço
cultural forte seu. É possível que as descobertas japonesas se caracterizem por
serem muito minuciosas e precisas, que as argentinas sejam mais relacionadas à
emoção e à impulsividade (Ivan Isquierdo?), etc. Cabe pesquisar, seria uma evidência forte do
quanto os conhecimentos escolares/acadêmicos, embora com marcas de
universalidade, não são independentes de cada cultura humana.
Enfim, itinerários
de uma pesquisa que tenha a força de desmistificar a tendência que sentimos nos
ambientes escolares de abordar os conhecimentos como se eles fossem isolados,
autônomos, ou esterilizados em relação à cultura imediata.