terça-feira, 24 de setembro de 2013

Escola também é cultura





Existe cultura sem escola, mas existe escola sem cultura?

Muitas vezes é essa a impressão que a escola passa.  Parece querer se independer da cultura.  Conhecimentos escolares/acadêmicos seriam uma categoria estanque separada do saber cotidiano, dos valores, das regionalidades, da arte em geral, do bom senso, do “jeito” de viver, da maneira de lidar com as tecnologias , enfim, de tudo que reconhecemos como sendo a cultura humana de uma dada comunidade.

Eu diria que quanto mais a escola tenta essa aventura vazia, a de se independer da cultura, mais se mostra insuficiente, alienante e improdutiva.

1. Pesquisar/estudar a bibliografia a respeito dessa interação e da resistência a essa interação, conhecer o pensamento sobre isso dos atores envolvidos diretamente com a escola é um caminho que gostaria de trilhar.

2. Em seguida, haveria que se verificar a validade da inclusão na escola de atividades culturais que não fossem “reféns” das atividades escolares, ou seja, que não fossem meras matérias-primas para as atividades escolares típicas, e sim que tivessem seu valor em si reconhecidas dentro da escola, como parte fundamental da formação do educando.

3. Outras linhas que se seguiriam a essas: conhecer profundamente um sistema educacional que valorize a vivência cultural dentro do processo escolar (parece que é o caso da Finlândia), e conhecer outro que não o faz (parece que é o caso do Brasil – nossas escolas podem ter fanfarras, mas não podem ter escolas de samba), pois assim teríamos dados da realidade e elementos concernentes da literatura científica que poderiam ser inter-relacionados para um resultado final consistente e, possivelmente, revelador de um vetor para a criação de uma escola integrada culturalmente e compatível com os novos tempos, os quais surgem e urgem.

4. Pesquisar a implicação da descoberta das várias inteligências humanas no desmonte da escola que conhecemos, isolada da cultura – causa possível: consideração quase exclusiva das inteligências lógico-linguística e lógico-matemática – e, por conseguinte, implicação dessa descoberta na criação da nova escola, que, ao reconhecer a diversidade intelectual e emocional humanas, aceitará sua plena imersão na cultura – produto óbvio de todos, vale dizer, de todas as inteligências humanas. 

5. A respeito da literatura sobre cultura, talvez seja um bom ponto de partida as elaborações teóricas propositoras de que a cultura faz-se muito mais na recepção do que na emissão.  Pois que os conhecimentos típicos produzidos na escola têm características universais (equação de 3º grau é equação de 3º grau no mundo inteiro), mas a forma como esses conhecimentos são percebidos, ou trabalhados, ou aprendidos, sofrem uma influência da cultura presente em cada ser humano envolvido no processo.  Daí a importância de se pesquisar a relação recepção-cultura. Talvez por isso, os grandes centros de pesquisa do mundo inteiro valorizam a multietnia na formação das equipes de pesquisadores.  Múltiplas e sutis diferenças produzindo enriquecimento do processo. 

6. No que tange à abordagem da arte no contato proposto escola-cultura, talvez fosse interessante estudar os teóricos que afirmam a capacidade da arte de ser produtora e expressão de conhecimentos, pensando-se aqui no conhecimento mais facilmente reconhecido como conhecimento escolar/acadêmico.  

7. Quanto à escola, talvez caiba detectar a presença da cultura ou a falta dela em todas as propostas para o trabalho com projetos de interdisciplinaridade e transdisciplinaridade, mas também pesquisar os autores que consideram os conhecimentos tipicamente escolares como produtos culturais.

8. Uma outra possibilidade talvez bastante original para essa pesquisa seria o levantamento de, p. ex., como os Prêmios Nobel de um país, ou pesquisas marcantes feitas por seus pesquisadores têm elos de identificação com traços de sua cultura.  Apenas a título de tentativa de encontrar evidências, poder-se-ia citar a “improvisação” de Cesar Lattes nas emulsões das chapas fotográficas que detectaram a sub-partícula méson-pi (o Nobel foi para o chefe de sua equipe, mas foi ele, Lattes, o responsável pela descoberta).  O que teria de brasileiro nisso?  Ora, o nosso desprendimento em relação aos trâmites mais tradicionais, nossa habilidade (para o bem e para o mal) para a improvisação, o “jeitinho brasileiro”, enfim, essa coisa meio iconoclasta. Quanto às teorias que relativizam o tempo e o espaço, qual país, visto pelos seus traços culturais mais característicos, melhor do que a Alemanha – geralmente associada a aprofundamento filosófico - para fazer essas descobertas.

Vale explicar que estou citando esse prêmio por ser muito conhecido e fácil de ser pesquisado, mas há outros indicadores, claro. E que estou trabalhando com ele por representar bem o conhecimento escolar ou acadêmico. 

Provavelmente, Prêmios Nobel ganhos por um mesmo país estejam relacionados com um traço cultural forte seu. É possível que as descobertas japonesas se caracterizem por serem muito minuciosas e precisas, que as argentinas sejam mais relacionadas à emoção e à impulsividade (Ivan Isquierdo?), etc.  Cabe pesquisar, seria uma evidência forte do quanto os conhecimentos escolares/acadêmicos, embora com marcas de universalidade, não são independentes de cada cultura humana.

Enfim, itinerários de uma pesquisa que tenha a força de desmistificar a tendência que sentimos nos ambientes escolares de abordar os conhecimentos como se eles fossem isolados, autônomos, ou esterilizados em relação à cultura imediata.